Índice
Em meio à crescente pressão de agricultores e à resistência política de países como a França ao acordo com o Mercosul, a União Europeia anunciou na quarta-feira (8) um conjunto de mecanismos para proteger o setor agroalimentar europeu diante do avanço do acordo de livre comércio com o bloco formado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.
A proposta apresentada pela Comissão Europeia, braço executivo da UE, prevê a possibilidade de ações rápidas e eficazes de salvaguarda em caso de aumento inesperado nas importações vindas do Mercosul ou de queda acentuada nos preços que prejudiquem produtores locais.
A medida, segundo Bruxelas, é uma tentativa de dar garantias suficientes aos países mais céticos ao acordo com o Mercosul — especialmente a França, que se opõe ao pacto por temer prejuízos à sua produção agrícola.
O pacote anunciado é visto como um gesto estratégico para mitigar resistências internas e preservar a viabilidade de um acordo comercial que poderá gerar, segundo estimativas, uma economia de mais de € 4 bilhões por ano para os exportadores europeus na América Latina.
Acordo UE-Mercosul: vigilância sobre produtos sensíveis
Entre os principais pontos anunciados estão a vigilância reforçada sobre produtos sensíveis, como carne bovina, frango, arroz, mel, ovos, alho e açúcar, além da produção de relatórios semestrais sobre o impacto das importações, tanto no mercado europeu em geral quanto em cada país membro.
A Comissão também poderá lançar investigações formais sempre que forem observados três gatilhos:
- Preço de importação 10% inferior ao de produtos similares da UE;
- Aumento superior a 10% no volume anual importado sob condições preferenciais;
- Queda de 10% nos preços em relação ao ano anterior.
Caso as investigações detectem “dano grave” ao setor europeu, a UE poderá suspender temporariamente os benefícios tarifários concedidos ao Mercosul, reinstaurando tarifas de importação sobre os produtos afetados.
O prazo máximo para conclusão dessas investigações será de quatro meses. Além disso, se um Estado-membro solicitar formalmente a apuração e houver indícios suficientes, o processo poderá ser iniciado em até 21 dias.
“O compromisso da Comissão é proteger os interesses do nosso setor agroalimentar de forma rápida e decisiva, se necessário”, afirmou o comissário europeu de Agricultura, Christophe Hansen.
Acordo histórico enfrenta impasses políticos
Após mais de 20 anos de negociações, o acordo entre UE e Mercosul foi validado pela Comissão Europeia em setembro de 2024. Trata-se de uma das maiores zonas de livre comércio do mundo, abrangendo cerca de 700 milhões de pessoas. A expectativa de Bruxelas é que o tratado seja ratificado até o fim de 2025, durante a presidência pro tempore do Brasil no Mercosul.
A França, porém, mantém forte oposição. O governo francês alega que o acordo pode ameaçar setores estratégicos como carne bovina, aves, açúcar e biocombustíveis, além de demandar padrões ambientais mais rígidos.
Por outro lado, países como a Alemanha apoiam ativamente o tratado, buscando diversificar mercados em meio à instabilidade comercial global, especialmente com o retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos.
Aprovação
Do lado brasileiro, fontes próximas ao governo Lula afirmam que já existe maioria necessária para a aprovação do acordo no Conselho Europeu: 15 dos 27 países membros, representando ao menos 65% da população da UE. O Brasil ocupa a presidência transitória do Mercosul.
Enquanto tenta consolidar apoio político interno, a Comissão Europeia aposta nas salvaguardas como instrumento de convencimento para aprovação do acordo.