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Juristas alertam que PEC da bandidagem é inconstitucional

por Gabriel Anjos
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Por Cleber Lourenço

A Proposta de Emenda à Constituição nº 3, de 2021, apelidada de PEC da Impunidade ou PEC da Bandidagem, voltou à pauta da Câmara dos Deputados com um substitutivo que tem provocado fortes críticas no meio jurídico e político. O texto altera dispositivos centrais da Constituição, como os artigos 53 e 102, para ampliar as prerrogativas de deputados e senadores. O objetivo é criar um escudo adicional contra processos e investigações, estabelecendo que ações criminais só possam avançar mediante autorização da respectiva Casa legislativa, em votação secreta e com prazo de até 90 dias.

Os principais pontos do substitutivo reforçam a blindagem parlamentar. Entre eles estão a proibição de prisão de congressistas salvo em flagrante de crime inafiançável, a exigência de aval político para abertura de qualquer processo criminal e a transferência para decisão da Câmara ou do Senado sobre a manutenção de prisões em flagrante. Se aprovado, o dispositivo cria um sistema em que o Parlamento passa a controlar até mesmo os desdobramentos de medidas cautelares e a continuidade de investigações, interferindo diretamente no espaço de atuação do Poder Judiciário.

Juristas afirmam que o substitutivo retoma mecanismos de blindagem já superados pela Constituição de 1988, que buscou equilibrar as relações entre os Poderes. Em parecer enviado à coluna, o jurista Marco Aurélio de Carvalho, coordenador do grupo Prerrogativas, destacou que o texto invade atribuições exclusivas da Justiça: “O problema é que o projeto pretende não só controlar eventual prisão em flagrante ou cautelar de parlamentares, mas pretende, vamos dizer, controlar a própria formação da culpa. Ao falar em formação da culpa, está substituindo a função do Judiciário. Essa emenda ofende a tripartição dos poderes, que é uma cláusula pétrea”.

Carvalho foi além e ressaltou que o Congresso não pode se colocar como árbitro de questões que pertencem ao Judiciário: “A proposta cria um modelo em que o Legislativo, que deveria legislar, passa a decidir se um processo deve ou não seguir adiante. Isso não é papel do Parlamento, é papel da Justiça. E quando se tenta alterar essa lógica, o resultado é a desfiguração do Estado Democrático de Direito”.

O constitucionalista Pedro Serrano reforçou a crítica, chamando atenção para o desequilíbrio institucional que a medida provoca. Segundo ele, ao condicionar a persecução penal de parlamentares ao aval político de seus pares, o Congresso passaria a se sobrepor ao Judiciário em matérias de competência constitucionalmente definida. “Ela ofende a forma específica de equilíbrio de poderes, na realidade, que é cláusula pétrea. Então, ela já de plano me parece inconstitucional”, avaliou.

Serrano também alertou que a proposta abre precedente perigoso: “Se hoje o Congresso cria para si o poder de decidir se um parlamentar pode ou não ser processado, amanhã esse raciocínio pode ser usado para blindar outras autoridades. O risco é instaurar uma lógica de privilégios que fere a ideia de igualdade perante a lei”.

O advogado Bruno Salles, também coordenador do grupo Prerrogativas, acrescentou uma crítica direta ao caráter político da proposta: “É uma blindagem que faz com que qualquer bandido tenha por objetivo se tornar um parlamentar do Congresso Nacional”. Para ele, o substitutivo transforma o mandato em um escudo contra a lei, criando incentivos perversos e ampliando a sensação de impunidade.

Especialistas ressaltam que a PEC tem caráter autossalvacionista, pois reduz a possibilidade de responsabilização de deputados e senadores durante o exercício do mandato. Além de fragilizar a capacidade de atuação do Supremo Tribunal Federal, o texto estabelece mecanismos que garantem proteção corporativa e dificultam qualquer tentativa de investigar ou punir parlamentares. Há também críticas ao uso do voto secreto, que fere o princípio da transparência e abre espaço para negociações obscuras dentro das Casas Legislativas.

O substitutivo reacendeu o debate sobre os limites da imunidade parlamentar e o risco de se criar um regime em que o Legislativo possa bloquear, de forma quase absoluta, a ação do Judiciário. Para setores da sociedade civil, a aprovação da emenda representaria um retrocesso democrático, ao reinstalar privilégios que desfiguram o equilíbrio entre os três Poderes e comprometem a credibilidade das instituições.

A votação deve ocorrer ainda nesta semana, em meio a intensas articulações no Congresso. Grupos de juristas, entidades de classe e parlamentares da oposição têm buscado alertar para os riscos de aprovação de uma proposta considerada, de saída, inconstitucional por ferir cláusulas pétreas da Carta Magna. Para esses atores, a medida não apenas amplia a blindagem de deputados e senadores, mas também enfraquece a própria ideia de República e de responsabilização dos agentes políticos.

Texto em discussão no Congresso amplia blindagem a parlamentares e fere a separação de poderes, segundo pareceres de Pedro Serrano, Marco Aurélio de Carvalho e Bruno Salles

Íntegra do substitutivo apresentado:

SUBSTITUTIVO À PROPOSTA DE EMENDA À CONSTITUIÇÃO Nº 3, de 2021

Altera os arts. 53 e 102 da Constituição Federal para dispor sobre prerrogativas parlamentares.

As Mesas da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, nos termos do § 3º do art. 60 da Constituição Federal, promulgam a seguinte Emenda ao texto constitucional:

Art. 1º O art. 53 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 53. …………………………………………………………………………………

§ 1º Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, não serão submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal e, a qualquer tempo, somente poderão ser presos em razão de crime de natureza pessoal ou real de foro de provimento.

§ 2º Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional não poderão ser presos, salvo em flagrante de crime inafiançável, nem processados criminalmente, sem prévia licença de sua Casa.

§ 3º A licença de que trata o § 2º será deliberada pela respectiva Casa Legislativa, por votação secreta da maioria de seus membros, em até noventa dias a contar do recebimento da ordem emanada pelo Supremo Tribunal Federal.

§ 4º O indeferimento do pedido de licença suspende a prescrição enquanto durar o mandato.

§ 5º No caso de flagrante de crime inafiançável, os autos serão remetidos, dentro de vinte e quatro horas, à Casa respectiva, para que, pelo voto secreto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão e autorize, ou não, a formação de culpa. ………………………………………………………………………. (NR)”

Art. 2º O art. 102 da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 102. ……………………………………………………………………….

I – ……………………………………………………………………

b) nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, os Presidentes …”

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