Por Cleber Lourenço
A votação do projeto que amplia a isenção do Imposto de Renda até R$ 5 mil mensais, aprovada por unanimidade na Câmara nesta quarta-feira (1º), foi marcada não apenas pela dimensão do benefício fiscal, mas também pela disputa política sobre o futuro da tabela do IR. O resultado desse embate foi a inclusão do artigo 6º, um dispositivo que obriga o Executivo a apresentar em até um ano um projeto de lei definindo uma política nacional de atualização dos valores que compõem o imposto de renda da pessoa física. Trata-se de uma saída política encontrada após intensas negociações e quebra de acordos de bastidores.
Durante a reunião de líderes que antecedeu a votação, havia sido acertado que a emenda da deputada Tabata Amaral (PSB-SP), que previa a correção automática da tabela pelo IPCA, seria votada em destaque, assim como a emenda do partido Novo, que tratava do mesmo tema. No entanto, momentos antes do texto chegar ao plenário, Arthur Lira (PP-AL), relator da proposta, não cumpriu o que havia sido definido.
A decisão surpreendeu parlamentares e gerou reclamações públicas. O deputado Gilson Marques (Novo-SC), vice-líder da minoria, levou o protesto ao microfone do plenário, denunciando a retirada do destaque que votaria a emenda de seu partido e rompimento do acordo.
O impasse não se limitou ao Novo. Outro destaque, assinado pelo deputado Pedro Campos (PSB-PE) em defesa da emenda de Tabata, também ficou ameaçado de não ser apreciado. Nos bastidores, Pedro chegou a iniciar uma articulação para coletar as 51 assinaturas necessárias a fim de apresentar um recurso que obrigasse a votação. Ao mesmo tempo, buscava uma interlocução direta com Arthur Lira para tentar salvar o acordo costurado previamente. A movimentação demonstrava a resistência de parte da base governista e do PSB em deixar o tema da atualização da tabela do IR ser enterrado de vez.
A leitura feita por Lira e por deputados próximos a ele, no entanto, era de que, mesmo se o destaque fosse levado a voto, dificilmente teria apoio suficiente para ser aprovado. O próprio governo era contra a inclusão do destaque na votação. Esse diagnóstico reduziu o incentivo para manter a votação do destaque em plenário. Com o acordo desfeito, cresceu a pressão dentro do PSB para encontrar uma solução que não deixasse o partido exposto.
Foi nesse contexto que surgiu a alternativa de inserir um dispositivo no próprio texto final, obrigando o governo federal a enviar ao Congresso, em até um ano, uma proposta estruturada de correção da tabela. Essa saída foi considerada mais pragmática e menos arriscada do que forçar uma votação de destaque fadada ao fracasso.
Deputado Pedro Campos (PSB-PE)
Isenção e reajuste da tabela do IR garantidos
O arranjo político consolidou-se rapidamente. Pedro Campos, que inicialmente ameaçava recorrer, passou a articular pela redação final do artigo 6º. O dispositivo, que não fixa um índice específico nem define a forma de atualização, transfere para o Executivo a responsabilidade de formular a política e enviá-la ao Legislativo. A manobra preserva a pauta de atualização da tabela, mas a empurra para um novo capítulo, a ser debatido futuramente em condições menos tensas e com a chancela do governo.
Em entrevista ao ICL Notícias após a votação, Pedro Campos celebrou a inclusão do artigo 6º: “O Brasil venceu. Finalmente votamos uma proposta que vai garantir justiça tributária, trazendo a contribuição dos 140 mil super-ricos para beneficiar mais de 20 milhões de brasileiros que hoje ganham até R$ 5 mil. Mais do que isso, nós articulamos a criação de um política nacional de reajuste anual da tabela do imposto de renda. Isso muda a história porque, a partir daí, nós vamos evitar que essa conquista seja corroída ao longo do tempo. A isenção, pela primeira vez, será atualizada anualmente, garantindo renda e preservando o poder de compra desses cidadãos. O reajuste da tabela do IR não deveria ser uma luta de milhões de brasileiros, mas um direito garantido por lei.”
Nos bastidores Pedro e Tabata já articulam um projeto de lei que regulamenta o tema.
O desfecho permitiu que o plenário avançasse sem novos embaraços. O projeto foi aprovado por 493 votos a favor e nenhum contra. Além da ampliação da faixa de isenção para até R$ 5 mil, o texto cria uma regra de desconto proporcional até R$ 7.350 e institui uma tributação mínima sobre as altas rendas, medida que atinge uma parcela pequena de contribuintes de maior poder aquisitivo. O resultado reforçou a narrativa de vitória ampla, mas deixou explícito que a atualização da tabela permanece como uma pauta sensível e que seguirá em disputa.
Assim, a aprovação do artigo 6º representa mais do que um detalhe técnico: foi a solução política encontrada para contornar uma quebra de acordo e evitar desgaste público de lideranças partidárias. Ao empurrar a definição para um projeto futuro, a Câmara garantiu a aprovação do texto principal e assegurou que o debate sobre a correção da tabela do IR não desapareça da agenda legislativa.