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No dia 1º de novembro, a Argentina enfrentava um compromisso financeiro crucial: o pagamento de uma parcela de US$ 840 milhões ao Fundo Monetário Internacional (FMI), referente ao pacote de socorro recorde concedido ao país nos últimos anos.
O que chamou a atenção dos especialistas, segundo reportagem do jornal O Globo, foi um movimento incomum registrado poucos dias antes da data limite. De forma inesperada, a conta argentina no FMI — onde ficam armazenados os chamados Direitos Especiais de Saque (DES), ou Special Drawing Rights (SDR) — aumentou em US$ 870 milhões. O valor foi suficiente para viabilizar o pagamento da parcela.
Mais curioso ainda é que, no mesmo período, os ativos dos Estados Unidos em DES diminuíram exatamente em US$ 870 milhões. A coincidência levantou suspeitas sobre uma possível ajuda financeira indireta do governo americano à gestão de Javier Milei.
Para analistas internacionais, a semelhança entre os valores não parece mero acaso. A hipótese mais aceita é que o presidente americano Donald Trump tenha encontrado uma nova forma de apoio financeiro à Argentina, por meio de uma transferência temporária de DES.
FMI não confirma ajuda a Argentina
O FMI não confirmou se o pagamento argentino foi efetivamente realizado, e tanto o Departamento do Tesouro dos EUA quanto o Banco Central da Argentina evitaram comentar o assunto. O Ministério da Economia argentino também não respondeu aos pedidos de esclarecimento.
Segundo Stephen Paduano, pesquisador da Universidade de Oxford e ex-assessor do Tesouro americano, “ou foi uma coincidência extraordinária, ou os Estados Unidos realmente financiaram a Argentina via DES para que ela pudesse honrar seus compromissos com o Fundo”.
Os DES são ativos internacionais criados pelo FMI e distribuídos entre seus países-membros conforme a participação de cada um no Fundo. Eles funcionam como reservas internacionais suplementares, que podem ser emprestadas ou transferidas entre nações mediante acordo bilateral.
Na prática, um país com sobra de DES pode repassá-los a outro que esteja enfrentando dificuldades de liquidez — algo que, segundo os analistas, parece ter ocorrido entre Estados Unidos e Argentina no fim de outubro.
O contexto político e a linha de crédito americana
O suposto apoio financeiro veio logo após o anúncio de uma linha de swap cambial de US$ 20 bilhões, firmada entre o Tesouro americano e o governo argentino em 20 de outubro. O acordo foi anunciado em meio à volatilidade cambial e à corrida por dólares que antecedeu as eleições legislativas argentinas.
Na época, os governos não detalharam o funcionamento da operação. Agora, há especulações de que parte desse acordo tenha incluído a transferência dos DES americanos para a conta argentina no FMI.
O secretário do Tesouro dos EUA, Scott Bessent, confirmou em entrevista à MSNBC que “foi aberta uma linha de crédito, uma pequena parte dela foi usada, e obtivemos lucro com isso”, sem entrar em detalhes sobre os mecanismos utilizados.
Como a operação pode ter ocorrido
Os Estados Unidos têm a prerrogativa de converter seus DES em dólares por meio de um acordo com o Federal Reserve (Fed), o banco central americano. No entanto, os registros do Fed mostram que nenhuma conversão desse tipo ocorreu em outubro, sugerindo que os ativos foram transferidos diretamente, e não transformados em moeda antes do repasse.
Essa manobra — se confirmada — representaria uma forma inovadora e indireta de apoio financeiro, permitindo à Argentina cumprir suas obrigações com o FMI sem romper as regras formais de crédito internacional.