A operação policial deflagrada na última terça-feira (28) nos complexos da Penha e do Alemão, no Rio de Janeiro, deixou pelo menos 119 mortos e reacendeu o debate sobre a letalidade das ações de segurança pública no estado. Batizada de Operação Contenção, a ação mobilizou mais de 2,5 mil agentes das polícias Civil e Militar e tinha como alvo lideranças do Comando Vermelho.
Considerada a mais letal da história do Brasil, a operação foi classificada pelo governo estadual como um “sucesso”. Nas palavras do governador Cláudio Castro, “as únicas vítimas foram os quatro policiais mortos” durante o confronto.
Enquanto o governo celebra os resultados, relatos de moradores e organizações locais apontam que corpos teriam sido abandonados em áreas de mata e que o trabalho de perícia foi comprometido. As denúncias incluem violação de cenas de crime, o que pode prejudicar futuras investigações.
Apesar da justificativa oficial, especialistas em direitos humanos apontam que o uso de força em larga escala tem produzido mais mortes do que resultados efetivos, perpetuando o ciclo de violência nas favelas.
Com isso, entidades nacionais e internacionais classificaram o episódio como uma “tragédia” e cobram transparência, investigação e responsabilização.
“Assassinato e sucesso não entram na mesma frase”
A Anistia Internacional classificou a operação como “desastrosa” e afirmou que o Estado brasileiro viola princípios básicos de legalidade, necessidade, proporcionalidade e precaução.
Em entrevista à TV Brasil, a diretora-executiva da organização, Jurema Werneck, afirmou que o número de mortos é inaceitável e que a ação expõe um padrão de violência que há anos atinge as comunidades pobres e negras do país.
“É preciso dizer que essa operação não é um sucesso. É desastrosa. Qualquer pessoa sabe que assassinato e sucesso não entram na mesma frase. Assassinato de centena de pessoas. Nós recebemos notícias de milhares de pessoas traumatizadas e que estão sofrendo”, afirmou Jurema.
Ela reforçou que a Anistia exige que o governo estadual apresente detalhes do planejamento da operação, das ordens dadas e do cumprimento de protocolos de segurança. “A gente só espera que as instituições brasileiras cumpram o seu dever. O mundo inteiro está vendo”, acrescentou.
O Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) , ONG especializada em segurança pública, também repudiou a operação. Em nota, a entidade afirmou que a operação “foi conduzida mais pelo viés político de quem acredita que mais mortes significam mais segurança do que pela racionalidade técnica”.
O presidente do Fórum, Renato Sérgio de Lima, afirmou que sem coordenação entre os entes federativos e investimentos em investigação e inteligência, “os mortos de ontem serão rapidamente repostos pelo crime organizado”.
ONU cobra investigação imediata de operação
O secretário-geral da ONU, António Guterres, declarou nesta quarta-feira (29) estar extremamente preocupado com o grande número de vítimas fatais e cobrou uma investigação urgente sobre as circunstâncias do confronto. Guterres enfatizou que o uso da força por autoridades policiais deve estar em conformidade com as leis internacionais de direitos humanos.
Já o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Volker Türk, pediu investigações rápidas, independentes e eficazes, e defendeu uma reforma completa do policiamento no Brasil.
Segundo Türk, qualquer uso de força potencialmente letal deve estar alinhado com os princípios de legalidade, necessidade, proporcionalidade e não discriminação.
Para o Alto Comissário, o Brasil precisa romper o ciclo de brutalidade extrema e garantir que as operações de segurança pública estejam em conformidade com os padrões internacionais.
*Com informações de Agência Brasil