Por Igor Mello, Juliana Dal Piva e Alice Maciel
Registros de ocorrência obtidos pelo ICL Notícias indicam que ao menos dois dos quatro policiais mortos durante a operação nos complexos do Alemão e da Penha, na última terça-feira (28), foram baleados antes do cerco policial na área de mata no topo da Vila Cruzeiro. O local desabitado, conhecido como Vacaria, concentrou grande parte dos 121 mortos confirmados –117 deles civis.
As informações apontam que os policiais do Batalhão de Operações Especiais (Bope) e da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) que teriam participado da chacina na Vacaria já sabiam que seus colegas tinham sido assassinados quando o confronto na região se intensificou. Grande parte dos corpos resgatados por moradores estavam nesta localidade.
Em declarações públicas, os secretários de Segurança, Victor Santos, e da Polícia Militar, Marcelo Menezes, afirmaram que a decisão de forçar o confronto na área de mata foi estratégica. Entretanto, a troca de tiros em uma área aberta — que dificulta o uso de técnicas de progressão — fez com que ao menos dois policiais fossem assassinados.
Segundo a documentação da Delegacia de Homicídios da Capital, elaborada com base em relatos feitos por policiais que participaram da operação na Zona Norte do Rio, o policial militar Cleiton Serafim Gonçalves e o policial civil Marcus Vinícius Cardoso de Carvalho foram atingidos por disparos de traficantes antes do cerco na mata, ainda na área habitada da Vila Cruzeiro.
Chefe de investigações da 53ª DP (Mesquita), Marcus Vinícius Cardoso de Carvalho, conhecido como “Máscara”, foi o primeiro a ser assassinado, por volta das 9h — cerca de três horas após o início da operação. Os policiais deram início à incursão por volta das 6h.
De acordo com o relato de seus colegas de delegacia, eles tentavam cumprir mandados de prisão na comunidade da Penha quando se abrigaram na laje de uma casa na Rua Nossa Senhora Aparecida, uma das principais da comunidade que liga os acessos à Vila Cruzeiro ao Campo da Vacaria — área de mata onde o suposto cerco aos traficantes ocorreu.
Nas proximidades do local, os policiais relatam que também foi baleado o delegado assistente da DRF, Bernardo Leal Anne Dias, atingido na perna. O delegado passou por cirurgia e continua internado em estado grave.
Morte de policial do Bope
Integrantes do Bope relataram em outro Registro de Ocorrência, que o 3º sargento Cleiton Serafim Gonçalves foi baleado às 10h04. Uma guarnição da tropa de elite da PM subia o Complexo do Alemão dentro de um caveirão, quando se deparou com uma barricada feita pelo tráfico. O sargento Serafim tomou a frente de um grupo de policiais encarregados de remover o bloqueio na localidade conhecida como Areal e acabou sendo baleado.
Relatos indicam que o Bope formou um bloqueio no topo da Serra da Misericórdia, que liga os complexos do Alemão e da Penha, descrito pela PM como “muro do Bope”. Enquanto isso, agentes de diversas delegacias da Polícia Civil subiram a Vila Cruzeiro, empurrando os traficantes para a área de mata.
O secretário de Segurança do Rio, Victor Santos, afirmou em entrevista coletiva nesta quarta-feira que a estratégia utilizada pelas forças de segurança foi forçar a fuga dos suspeitos para a área da Vacaria. “Optamos por deslocar o contato com os criminosos para a área de mata, onde eles efetivamente se escondem e atacam os policiais. A opção foi feita para preservar a vida dos moradores”, alegou ele.
Os ROs mostram, contudo, que a tática fez com que parte dos policiais fossem vitimados antes da chegada ao local desabitado, nos acessos à área de mata.
Bunker na área de mata
Outros dois policiais morreram na área da mata: o Policial Civil Rodrigo Velloso e o sargento do Bope Heber Carvalho da Fonseca. O subtenente Luís Cláudio Fernandes Leal foi baleado na mesma região.
Em depoimento anexado ao Registro de Ocorrência, militares relataram que quando chegaram à região Vacaria, o policial civil Rodrigo Velloso Cabral já estava morto e sozinho. Ele tinha entrado na corporação havia apenas 40 dias. “Que durante patrulhamento em área da mata, na localidade conhecida como Vacaria, sua equipe localizou um homem caído ao solo, já em óbito, posteriormente identificado como o policial civil Cabral”, diz o documento.
No mesmo depoimento, o militar conta que ao se aproximar da área, “foram emboscados por criminosos fortemente armados que efetuaram diversos disparos de arma de fogo, bem como lançaram uma granada contra os militares”.
O policial relatou ainda que os criminosos se abrigaram em uma espécie de “bunker de pedra”, de onde atiravam contra a corporação.
“Pela dinâmica observada e pelas circunstâncias do confronto, acredita que os criminosos que atingiram o policial civil [Velloso] sejam os mesmos que atingiram os policiais do Bope [Fonseca e Leal]”.