Antes de tudo, antes mesmo da esotérica jurubeba da sexta-feira, é preciso recitar o antropólogo, sociólogo, escritor e político mineiro-carioca-brasileiro Darcy Ribeiro:
“Fracassei em tudo o que tentei na vida.
Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui.
Tentei salvar os índios, não consegui.
Tentei fazer uma universidade séria e fracassei.
Tentei fazer o Brasil desenvolver-se autonomamente e fracassei.
Mas os fracassos são minhas vitórias.
Eu detestaria estar no lugar de quem me venceu”.
Os fracassos do professor Darcy (1922-1997) explicam o Brasil. Um fracasso em especial, o da educação, diz tudo sobre o conjunto de chacinas, massacres e genocídios do país — como o desta semana no Rio.
Uma derrota que começa lá em 1986, quando Moreira Franco (PMDB), o gato angorá, triunfa sobre Darcy (PDT) na eleição estadual fluminense — Fernando Gabeira (PT) foi o terceiro na disputa.
E de derrota em derrota, Wilson Witzel mira na cabecinha e Claudio Castro termina o serviço sujo — para ficar apenas nos últimos dos governadores pistoleiros.
Só o Kid Morengueira na causa para me ajudar a narrar essa história.
Na ruína dos Cieps do Darcy e do Brizola, as facções e as milícias matriculam os alunos, para servi-los de bandeja aos vampiros sedentos nos palanques da extrema direita.
Banho de ódio nos algoritmos, sorrisos disfarçados no boa noite dos telejornais.
Em vez dos centros integrados de Educação Pública, com maiúsculas e cursivas, a pedagogia da bala.
(A primeira derrota de Darcy, no mesmo assunto, havia sido em 1964, ao lado de Paulo Freire. Fracasso retumbante. Exílio. Coturno na bunda desses comunistas!)
Ô homem para perder, minha gente, ô Rio de azares.
Em vez de educação integral, rematrícula no crime, só trocar a facção pela milícia bolsonarista laureada em gabinetes da Alerj.
Darcy Ribeiro tem uma derrota por dia no morro e no asfalto. A escola em ruína vira depósito de cadáveres.
Outro dia, a caminho de Campos dos Goytacazes, Juca Kfouri viu um esqueleto de um Ciep e me descreveu com a melancolia do tempo perdido no relógio (civilizatório) da política.
“Tentei alfabetizar as crianças brasileiras, não consegui”, a voz do derrotado assombra dentro daquela construção abandonada. “Se os governantes não construírem escolas, em 20 anos faltará dinheiro para construir presídios”, a mesma voz repete entre os escombros.