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DERRITE E MOTTA CONTRA A PF

por Chico Alves
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No momento em que negociadores diplomáticos do mundo inteiro estão reunidos no Brasil para discutir a pauta de mudanças climáticas, o conteúdo do projeto de lei Antifacção, em tramitação na Câmara dos Deputados, poderia causar um impacto muito negativo na atuação da Polícia Federal (PF) no combate a delitos ambientais vinculados ao crime organizado, como o garimpo e o tráfico de drogas na Amazônia. É o que aponta o diretor de Amazônia e Meio Ambiente da PF, Humberto Freire de Barros.

“No momento em que o mundo inteiro está trabalhando a criação de novas parcerias, em que o próprio Brasil criou o Centro de Cooperação Policial Internacional da Amazônia, o CCIP Amazônia, é surpreendente que a gente tenha uma proposta que busque excluir a Polícia Federal de certas investigações e de certas atribuições”, disse o delegado à Agência Brasil, enquanto circulava pelos corredores da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), em Belém, na tarde desta terça-feira (11).

Parecer do deputado Guilherme Derrite (PP-SP), relator do projeto, condicionou as investigações conjuntas da Polícia Federal com forças estaduais sobre crimes relacionados a facções criminosas a um pedido formal do governador. Derrite, que ocupava o cargo de secretário de Segurança Pública de São Paulo, na gestão Tarcísio de Freitas, se licenciou do cargo para à Câmara justamente para atuar nessa relatoria. Após pressões, ele recuou e modificou o artigo 11 do texto para permitir que a PF faça operações conjuntas com as policias estaduais sem a necessidade de aval do governador.

“Com certeza [a restrição se aplicaria a crimes ambientais] porque condicionaria a Polícia Federal a investigar garimpo ilegal, extração de madeira, em determinado determinados estados da Amazônia Legal, ao pedido desse estado”, observou Freire Barros. “Isso é inconcebível”, acrescentou.

A Polícia Federal emitiu nota com críticas duras ao texto de Derrite. “Pelo relatório apresentado, o papel institucional histórico da Polícia Federal no combate ao crime — especialmente contra organizações criminosas de grande alcance — poderá sofrer restrições significativas. A execução de operações pela Polícia Federal dependeria de solicitação do governo estadual da região investigada, o que representa um risco de interferência indevida”, diz o texto.

E continua: “Essa alteração afronta o processo de investigação policial e pode favorecer interesses locais eventualmente vinculados a organizações criminosas, crimes de corrupção e desvios de recursos públicos, entre outras ilicitudes”, reclama a nota. “Pelas regras propostas no relatório em discussão, grandes operações, como a Tank e Quasar, estariam sob ameaça de não ocorrerem ou de terem seus efeitos severamente limitados”.

Repercussão do texto assustou Motta

Especialistas, o governo e a própria PF argumentaram que o primeiro texto do relator era inconstitucional, por condicionar operações conjuntas da PF com forças estaduais a uma provocação do governador, retirando atribuições da organização, ligada à União.

A repercussão do caso levou o presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), que foi quem indicou Derrite para relatar o projeto de lei, a descartar qualquer alteração que prejudique a autonomia de investigação pela PF.

Criada em 2023, a Diretoria de Amazônia e Meio Ambiente da PF buscou priorizar e intensificar o combate ao crime organizado na região e aos crimes ambientais.

“Conseguimos formatar uma grande parceria, um impacto realmente para proteção da Pan Amazônia, combatendo para isso os crimes ambientais que infelizmente se fortaleceram em um período recente. O minério ilegal se instalou na Amazônia, a retirada de madeira, grilagem de terra e a gente desencadeou, com o Plano Amas, as ações para reverter ver tudo isso”, destacou o diretor.


Freire Barros enfatizou que o foco da PF é principalmente o trabalho de inteligência, para desmantelar o comando e o financiamento do garimpo ilegal e outros crimes associados, como desmatamento e extração ilegal de madeira.

O governo federal fixou dois pontos principais que deseja alterar no substitutivo do Projeto de Lei Antifacção, apresentado pelo relator Guilherme Derrite (PP-SP): o papel e as atribuições da Polícia Federal (PF) no combate ao crime organizado e o uso da Lei das Organizações Criminosas, e não na Lei Antiterrorismo, para o estabelecimento de penas contra as facções. O argumento é que o emprego da Lei Antiterrorismo, como está no texto do relator, cria pretexto para interferências de países estrangeiros no Brasil.

Em reunião de líderes da Câmara nesta terça-feira (11), o líder do governo na Casa, deputado José Guimarães (PT-CE), destacou que estão sendo discutidas mudanças no texto para se votar o mérito da matéria nesta quarta-feira (12).

“Tem um relator que foi definido legitimamente pelo presidente da Casa e nós vamos negociar com ele até amanhã [quarta-feira], se for necessário [vamos trabalhar] à noite toda para votarmos essa matéria”, disse o parlamentar.

O texto apresentado por Guilherme Derrite foi criticado por especialistas, pelo governo federal e pela Polícia Federal por condicionar as operações conjuntas entre policiais federais e estaduais a uma solicitação do governador.

Após as críticas, Derrite recuou e apresentou novo texto retirando a exigência de pedido do governador para investigações conjuntas entre as polícias. Porém, o relator, que pediu licença do cargo de secretário de Segurança Pública de São Paulo para relatar o projeto, incluiu a exigência de a PF comunicar os estados sobre as operações contra o crime organizado.

O líder do governo, José Guimarães, defendeu que as atribuições da Polícia Federal não devem ser alteradas pelo projeto.

“Polícia Federal nem dá para tirar, nem botar. É deixar como está. A Polícia Federal tem autonomia para fazer as operações que ela quiser. E, portanto, nós vamos buscar esse entendimento”, afirmou.

Terrorismo

Outro tema de divergência é em relação às modificações na Lei Antiterrorismo. O substitutivo de Guilherme Derrite inclui nessa lei as penas mais duras para os membros de facções criminosas.

O governo concorda que é possível aumentar as penas, mas que seja feito na Lei das Organizações Criminosas para evitar que país estrangeiro use a questão para prejudicar o Brasil.

“Nós somos favoráveis a aumentar a pena, então porque colocar na Lei Antiterrorista? Os prejuízos econômicos serão enormes, como já explicou o ministro [da Fazenda, Fernando] Haddad. Um fundo da Arábia Saudita, que quer investir no país, às vezes tem cláusulas que não pode investir no país que tenha organizações terroristas”, justificou o parlamentar.


Em seu parecer, o relator Guilherme Derrite argumenta que o risco de interferência estrangeira estaria afastado uma vez que o projeto não classificaria as facções como terroristas “em sentido estrito”.

“Não se trata de classificar as organizações criminosas, paramilitares ou milícias privadas como organizações terroristas em sentido estrito, mas de reconhecer que certas práticas cometidas por essas estruturas produzem efeitos sociais e políticos equivalentes aos atos de terrorismo, justificando, portanto, um tratamento penal equiparado quanto à gravidade e às consequências jurídicas”, explicou.

O governo entende que essa justificativa não se sustenta, como explicou à Agência Brasil o secretário Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça, Mário Sarrubbo.

“Para um país estrangeiro, não haverá distinção nenhuma nessa questão. Ou seja, o estrangeiro vai olhar e vai falar que estamos equiparando [criminoso] a terrorista. Vão dizer que o Brasil abriga grupos terroristas”, reafirma Sarrubbo.

O líder do PP na Câmara, deputado Doutor Luizinho (PP-RJ), saiu em defesa do relator Guilherme Derrite e disse estar seguro de que a Câmara chegará a um texto que agrade também ao governo.

“Nós estamos sendo extremamente corretos com o governo na maioria absoluta das matérias, e não será diferente desta vez. Teremos um deputado progressista que vai ser correto, acima de tudo com o Brasil, e vamos ter um relatório que possa chegar de forma a ser aprovado no plenário”, disse.

Com Agência Brasil (Lucas Pordeus León e Pedro Rafael Vilela)

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