Por Raquel Lopes e Carolina Linhares
(Folhapress) – O deputado Guilherme Derrite (PP-SP) apresentou na noite desta segunda-feira (10) um novo substitutivo que permite à Polícia Federal investigar facção, desde que aconteça em parceria ou comunicação prévia às autoridades estaduais.
O texto anterior excluía a Polícia Federal e o Ministério Público de investigações sobre crimes praticados por facções criminosas, milícias e grupos paramilitares ou poderia haver uma cooperação com aval do governador.
A mudança ocorre depois que a própria PF criticou as alterações feitas por Derrite, relator do PL Antifacção no Congresso, afirmando que as mudanças representam um risco de enfraquecimento nas ações que miram esses grupos.
Derrite é secretário da segurança pública do governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) e foi designado relator pelo presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), na última sexta-feira (7). Por se tratar de um projeto de autoria do governo federal, a escolha foi vista como um revés para o governo Lula (PT).
O secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, durante sua filiação ao PP, em maio
Logo após a manifestação da corporação, Motta informou ter intermediado um diálogo entre Derrite e o diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues, para que o projeto mantenha as atribuições da corporação nessas investigações. Motta incluiu o tema na pauta de votação desta semana.
Apesar da mudança, a avaliação de especialistas e membros do governo é que a nova versão permanece com problemas.
Novo texto de Derrite: PF poderá participar de investigação após pedido da polícia estadual
Segundo o texto, a Polícia Federal poderá participar das investigações, assim como qualquer delito ligado a essas organizações, em caráter integrativo com a polícia estadual.
A atuação da PF deverá ocorrer mediante solicitação do delegado de polícia estadual ou do Ministério Público estadual ou por iniciativa própria. No entanto, neste segundo caso, a corporação teria que comunicar a investigação às autoridades estaduais.
A atuação da Polícia Federal, segundo a nova versão, não transfere automaticamente o processo para a Justiça Federal. O julgamento seguirá na esfera que tiver competência sobre o crime, de acordo com a natureza do delito e as regras de competência definidas pela legislação processual.
“Alteração do art. 11, da Lei nº 12.360/16, para garantir que a Polícia Federal participe das investigações de organizações criminosas, paramilitares ou milícias civis, em caráter cooperativo com a polícia estadual respectiva, sempre que os fatos investigados envolverem matérias de sua competência constitucional ou legal”, diz o relator no documento.
“Assegura-se, ainda, a participação, quando cabível, do Ministério Público estadual respectivo e do Ministério Público Federal. Isso preserva as prerrogativas já garantidas na legislação pátria e promove a integração cooperativa interinstitucional que se espera em crimes desta complexidade”, acrescenta.
Outro ponto que foi modificado é que o texto anterior estabelecia que, quando houvesse repercussão interestadual ou transnacional, o Ministério da Justiça poderia, mediante provocação do governador, determinar a atuação conjunta ou coordenada das forças policiais federal e estaduais. Esse ponto foi retirado.
Na avaliação da pasta da Justiça, isso inseria um componente político em investigações criminais que deveriam ser totalmente técnicas.
“O texto continua muito ruim. Ele retirou a exigência de provocação ao governador, mas mantém a lógica de transferir toda a competência às polícias civis ou de submetê-la à autorização do estado”, afirmou Marivaldo Pereira, secretário de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça.
“Se a PF quiser investigar o escritório do crime e houver envolvimento de autoridades locais, ela será obrigada a avisar o próprio estado? O projeto, na prática, cria mecanismos de blindagem ao crime organizado. É o presente de Natal que Derrite entrega às organizações criminosas”, continuou.
A primeira versão do projeto sofreu críticas de integrantes do governo, petistas e parlamentares, além do próprio Lula, aumentando o sentimento de desconfiança de governistas com a gestão de Motta. No fim de semana, o chefe do Executivo telefonou para o deputado para se queixar da escolha.
Integrantes do governo avaliam que o relatório tem um propósito “exclusivamente político-eleitoral” e representa um retrocesso no esforço de combate ao crime organizado.
O projeto era a principal aposta do presidente para responder à crise da segurança pública gerada pela pela megaoperação da polícia do Rio, que resultou na morte de mais de 120 pessoas. Desde que foi deflagrada, a operação tem sido usada com objeto de embate entre governo e oposição, tendo como pano de fundo as eleições de 2026.
O presidente do PT, Edinho Silva, disse à Folha que a decisão de Motta representa “a total partidarização, politização de um tema que deveria ser tratado sem paixões”.