Por Gabriel Gomes
A Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj) aprovou nesta quarta-feira (22), em votação única, o projeto de lei da gestão Cláudio Castro (PL) que autoriza o uso de dinheiro do Rioprevidência, fundo de aposentadoria dos servidores, para pagamento de dívidas com a União. O texto foi aprovado com 48 votos a favor e 21 contra. A proposta segue para sanção do governador.
A proposta teve apenas duas das 113 emendas apresentadas aceitas — uma delas estabelece que a medida só terá validade até 31 de dezembro de 2026. O projeto de Lei 6.035/25 autoriza o uso de royalties e participações especiais de petróleo e gás natural, destinados atualmente ao Rioprevidência, para o pagamento da dívida com a União. No ano passado, o governo já havia utilizado quase R$ 5 bilhões do fundo para quitar parte desse débito.
A sessão que aprovou a medida foi marcada por protestos de servidores, que tomaram a fachada e a galeria da Alerj para se manifestar de maneira contrária. Um telão foi instalado do lado de fora para transmitir a votação ao vivo. Mesmo com a pressão, a base do governo garantiu a aprovação do texto com ampla maioria.
Ao ICL Notícias, deputado Flávio Serafini (PSOL), ex-presidente da CPI do Rioprevidência (2019–2021), alertou que o uso desses recursos representa risco à aposentadoria dos servidores. “Este ano em que o Estado ainda está tendo uma arrecadação alta com royalties e participações especiais, ao tirar dinheiro do Rioprevidência, pode já a partir do ano que vem, quando a previsão é que o valor de arrecadação caia, não ter dinheiro para pagar os aposentados e pensionistas, atrase esse pagamento e tenha, como consequência, quebrar o Estado”, aponta.
Durante a sessão, o deputado Luiz Paulo (PSD) afirmou que levará o caso ao Tribunal de Justiça do Rio por sua “inconstitucionalidade”, argumentado que “o tema da previdência não deve ser ratado por lei ordinária, mas sim complementar.”
Vinícius Zanata, presidente da Associação dos Servidores do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (Assemperj) e do Conselho Fiscal do Fundo Único de Previdência Social — Rioprevidência, alertou sobre os riscos do projeto, que “abre espaço para gastar mais, especialmente em um ano pré-eleitoral”.
“Isso preocupa muito, porque não há garantia de que, nos próximos anos, o estado consiga manter os pagamentos caso o valor do barril de petróleo caia, o que já é uma tendência. O Rio é responsável por cerca de 80% da produção nacional, então qualquer oscilação no preço do petróleo desestabiliza as receitas do estado e, consequentemente, a Previdência dos servidores”, explicou.
Em nota, o Rioprevidência afirmou que “os royalties do petróleo são fundamentais para que o Rioprevidência honre seu compromisso com os servidores do Estado”. “Seja qual for o cenário, confiamos na responsabilidade do Governo na proposição do PL e na competência do Legislativo em ajustar e refinar a proposta, sempre visando assegurar a sustentabilidade do Sistema Previdenciário Estadual e atender ao compromisso do poder público com seus aposentados e pensionistas”, diz.
Já o governo do Rio de Janeiro disse, em nota, que a medida “é uma das ações que visam contribuir para o equilíbrio das finanças públicas fluminenses, fortalecendo o Tesouro Estadual, o verdadeiro garantidor do Rioprevidência”. O governo argumenta que a medida vai reduzir o endividamento estadual e criar espaço fiscal para manter serviços públicos. O texto prevê que a compensação seja feita com base nos aportes do estado ao Rioprevidência nos últimos dez anos, descontando os R$ 4,9 bilhões já transferidos em 2024.
De acordo com a Lei Orçamentária Anual de 2026, as despesas com o serviço da dívida estão estimadas em R$ 12,3 bilhões, enquanto a arrecadação com royalties e participações especiais deve chegar a R$ 21,5 bilhões. Desse total, R$ 17,8 bilhões estão previstos para o Rioprevidência, que terá R$ 31,1 bilhões em despesas previdenciárias no próximo ano.
Veja como votou cada deputado na proposta do governo do RJ:
TCE apontou irregularidades na gestão do Rioprevidência
O Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) apontou irregularidades na gestão do fundo, incluindo investimentos de mais de R$ 2,6 bilhões em fundos vinculados ao Banco Master, sob investigação da Polícia Federal por suspeita de fraude.
Em 2024, o governo já autorizou a retirada de quase R$ 5 bilhões do fundo para pagamento da dívida com a União. A CPI do Rioprevidência revelou um prejuízo estimado em R$ 17 bilhões causado por má gestão entre 2005 e 2015, com o estado contraindo um empréstimo de R$ 7 bilhões cuja dívida final deverá atingir R$ 30 bilhões—quase quatro vezes maior devido a juros elevados.
O relatório da CPI indicou indiciamentos de ex-governadores Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão, além de ex-secretários estaduais de Fazenda.