Por Gabriel Gomes
O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PL), sancionou, em edição extraordinária do Diário Oficial desta segunda-feira (27), a lei que autoriza o uso de dinheiro do Rioprevidência, fundo de aposentadoria dos servidores, para pagamento de dívidas com a União. A medida foi aprovada, na quarta-feira (22), pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).
A lei foi aprovada, sob protestos, no Legislativo por 48 votos a favor e 21 contrários, com apenas duas das 113 emendas apresentadas aceitas — uma delas estabelece que a medida só terá validade até 31 de dezembro de 2026. A medida autoriza o uso de royalties e participações especiais de petróleo e gás natural, destinados atualmente ao Rioprevidência, para o pagamento da dívida com a União. No ano passado, o governo já havia utilizado quase R$ 5 bilhões do fundo para quitar parte desse débito.
A sessão que aprovou a medida foi marcada por protestos de servidores, que tomaram a fachada e a galeria da Alerj para se manifestar de maneira contrária. Um telão foi instalado do lado de fora para transmitir a votação ao vivo. Mesmo com a pressão, a base do governo garantiu a aprovação do texto com ampla maioria. Deputados de oposição afirmam que vão contestar a medida no Judiciário.
Ao ICL Notícias, deputado Flávio Serafini (PSOL), ex-presidente da CPI do Rioprevidência (2019–2021), alertou que o uso desses recursos representa risco à aposentadoria dos servidores. “Este ano em que o Estado ainda está tendo uma arrecadação alta com royalties e participações especiais, ao tirar dinheiro do Rioprevidência, pode já a partir do ano que vem, quando a previsão é que o valor de arrecadação caia, não ter dinheiro para pagar os aposentados e pensionistas, atrase esse pagamento e tenha, como consequência, quebrar o Estado”, aponta.
Vinícius Zanata, presidente da Associação dos Servidores do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (Assemperj) e do Conselho Fiscal do Fundo Único de Previdência Social — Rioprevidência, alertou sobre os riscos do projeto, que “abre espaço para gastar mais, especialmente em um ano pré-eleitoral”.
“Isso preocupa muito, porque não há garantia de que, nos próximos anos, o estado consiga manter os pagamentos caso o valor do barril de petróleo caia, o que já é uma tendência. O Rio é responsável por cerca de 80% da produção nacional, então qualquer oscilação no preço do petróleo desestabiliza as receitas do estado e, consequentemente, a Previdência dos servidores”, explicou.
Veja como votou cada deputado:
TCE apontou irregularidades na gestão do Rioprevidência
O Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) apontou irregularidades na gestão do fundo, incluindo investimentos de mais de R$ 2,6 bilhões em fundos vinculados ao Banco Master, sob investigação da Polícia Federal por suspeita de fraude.
Em 2024, o governo já autorizou a retirada de quase R$ 5 bilhões do fundo para pagamento da dívida com a União. A CPI do Rioprevidência revelou um prejuízo estimado em R$ 17 bilhões causado por má gestão entre 2005 e 2015, com o estado contraindo um empréstimo de R$ 7 bilhões cuja dívida final deverá atingir R$ 30 bilhões—quase quatro vezes maior devido a juros elevados.
O relatório da CPI indicou indiciamentos de ex-governadores Sérgio Cabral e Luiz Fernando Pezão, além de ex-secretários estaduais de Fazenda.
O que diz o governo Cláudio Castro?
Em nota, o Rioprevidência afirmou que “os royalties do petróleo são fundamentais para que o Rioprevidência honre seu compromisso com os servidores do Estado”. “Seja qual for o cenário, confiamos na responsabilidade do Governo na proposição do PL e na competência do Legislativo em ajustar e refinar a proposta, sempre visando assegurar a sustentabilidade do Sistema Previdenciário Estadual e atender ao compromisso do poder público com seus aposentados e pensionistas”, diz.
Já o governo do Rio de Janeiro disse, em nota, que a medida “é uma das ações que visam contribuir para o equilíbrio das finanças públicas fluminenses, fortalecendo o Tesouro Estadual, o verdadeiro garantidor do Rioprevidência”. O governo argumenta que a medida vai reduzir o endividamento estadual e criar espaço fiscal para manter serviços públicos. O texto prevê que a compensação seja feita com base nos aportes do estado ao Rioprevidência nos últimos dez anos, descontando os R$ 4,9 bilhões já transferidos em 2024.
De acordo com a Lei Orçamentária Anual de 2026, as despesas com o serviço da dívida estão estimadas em R$ 12,3 bilhões, enquanto a arrecadação com royalties e participações especiais deve chegar a R$ 21,5 bilhões. Desse total, R$ 17,8 bilhões estão previstos para o Rioprevidência, que terá R$ 31,1 bilhões em despesas previdenciárias no próximo ano.