Por Fernanda Mena
(Folhapress) – Será lançada nesta sexta-feira (7), ao final da Cúpula dos Líderes que antecede a COP30, a Declaração de Belém sobre o Combate ao Racismo Ambiental. O documento foi uma iniciativa do governo brasileiro que posiciona o tema junto ao debate das negociações climáticas a partir da assinatura de 19 países do chamado Sul Global, o grupo de nações emergentes, e ficará aberto para demais adesões.
O objetivo é debater a maneira como a discriminação, as desigualdades e os legados do colonialismo impactam a forma como diferentes povos vivenciam a exposição à poluição, os riscos climáticos e o acesso a serviços e tecnologia.
O pedido partiu dos ministérios da Igualdade Racial (MIR) e dos Povos Indígenas (MPI) e se tornou pauta cara ao governo, que elaborou a declaração no âmbito da COP30 para dar mais visibilidade e relevância ao tema tanto nos foros internacionais de meio ambiente quanto nos de direitos humanos. Trata-se, no entanto, de um instrumento político não vinculante, ou seja, que não gera obrigações legais em direito internacional.
O texto conclama as nações a “cooperar na tarefa essencial de combater o racismo ambiental” e afirma que “o desenvolvimento sustentável somente será alcançado quando forem eliminadas as desigualdades que afetam de forma desproporcional pessoas afrodescendentes, povos indígenas, comunidades tradicionais e outros grupos e minorias vulneráveis em todas as regiões do mundo”.
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O documento afirma também que a erradicação da pobreza “em todas as suas dimensões, a promoção da igualdade étnico-racial e a proteção do meio ambiente são dimensões interconectadas e indispensáveis do desenvolvimento sustentável”. E convida os países a “fortalecer os esforços coletivos voltados à construção de sociedades justas e inclusivas por meio do combate ao racismo ambiental”.
Para a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, a declaração é um sinal de que a COP30 começa muito bem, “com o reconhecimento de que esse é um problema real e muito urgente”.
“A população negra equivale a mais de 70% nas favelas e periferias, onde o impacto das tragédias climáticas é muito maior. Isso não é por acaso. Nos territórios quilombolas as florestas são 80% menos desmatadas. Junto com os indígenas, a população negra está entre as que mais sofrem com as mudanças climáticas e os que melhor cuidam do meio ambiente”, afirmou Anielle à Folha de S.Paulo.
A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, afirma que as discussões climáticas foram ganhando outros contornos ao longo do tempo, de modo que temas vinculados aos direitos humanos perderam força. A declaração antes da COP30 seria, portanto, uma maneira de “retornar ao debate e buscar uma estratégia de médio prazo de integração dessas agendas”.
“Esses temas serão centrais no pavilhão do ciclo dos povos que vai acontecer na Zona Verde e vai congregar todos esses segmentos de povos indígenas, comunidades tradicionais, afrodescendentes e produtores e produtoras da agricultura familiar”, disse Guajajara. “Será um marco para debates futuros nesta e em outras esferas de negociação internacional.”
A adesão modesta se deve, segundo fontes ouvidas pela reportagem, a dois fatores principais. Primeiro, ao fato de não haver definição consagrada globalmente para a ideia de racismo ambiental. Segundo, ao fato de que o reconhecimento da exposição desproporcional a danos ambientais e a riscos climáticos implica no debate sobre reparação de perdas e danos, e poucos países estariam já preparados para as implicações financeiras disso.
Segundo a assessora de Clima e Racismo Ambiental do Instituto da Mulher Negra Geledés, Mariana Belmont, a declaração é “um marco político e simbólico fundamental porque reconhece que a crise climática é também uma crise de justiça racial e social”.
“O documento chama os Estados a uma cooperação internacional baseada na equidade, na solidariedade e na reparação histórica, reforçando que a transição precisa ser justa, inclusiva, feminista e antirracista para que ninguém fique para trás”, afirma Belmont.