Por Cleber Lourenço
O deputado Danilo Forte (União-CE) é o autor de um projeto de lei que pretende enquadrar facções criminosas e milícias como organizações terroristas, alterando a Lei Antiterrorismo (13.260/2016). O texto vem sendo apresentado pelo parlamentar como uma resposta à escalada da violência e à falta de integração entre os órgãos de segurança, mas tem provocado resistência entre juristas e especialistas em inteligência, que alertam para o risco de uso político e abuso de autoridade.
Durante entrevista ao ICL Notícias, Forte afirmou que o Brasil enfrenta uma criminalidade “com características de terrorismo” e que o Estado precisa “agir com a mesma força e estratégia” que as facções têm usado para se consolidar em territórios.
“As facções e milícias já não atuam apenas como organizações criminosas: elas usam o terror como instrumento de poder, atacam infraestrutura e paralisam serviços essenciais para intimidar o Estado e a população. É o terrorismo à brasileira.”
Segundo o deputado, o objetivo do projeto é dar mais autonomia e recursos à Polícia Federal, que, sob sua proposta, passaria a coordenar de forma direta o enfrentamento ao crime organizado.
“A legislação atual não alcança plenamente esse tipo de conduta. O projeto cria mecanismos que fortalecem a atuação da Polícia Federal e modernizam o combate ao crime, com foco na cooperação internacional e no bloqueio de ativos ilícitos.”
Danilo Forte reconhece que a legislação atual já dispõe de instrumentos de investigação, mas sustenta que o enquadramento como terrorismo daria “peso jurídico e simbólico” às ações do Estado.
“Não é apenas questão de punição. É dar o nome correto ao problema. O que o Brasil vive é um cenário de terror, em que o crime controla economias locais, impõe toque de recolher, desafia o Estado e mata agentes públicos. Isso não é só crime organizado, é terrorismo.”
O deputado também afirma que seu projeto reforça a soberania nacional e nega que a mudança possa abrir brechas para intervenções estrangeiras ou interferência de agências internacionais.
“Esse risco não existe. O projeto fortalece a soberania nacional, não o contrário. O Brasil precisa de uma legislação moderna, capaz de responder à realidade das facções. O que não podemos é continuar com um Estado fragilizado diante do crime organizado.”
Forte defende ainda a integração entre órgãos de segurança e de inteligência e diz que a Polícia Federal deve atuar em conjunto com as Forças Armadas e as polícias estaduais, respeitando as competências de cada instituição.
“O terrorismo é de competência federal. Isso significa que a PF passará a coordenar investigações e inteligência, enquanto as polícias estaduais continuarão atuando na ponta. O crime hoje é interestadual e internacional. É preciso uma resposta no mesmo nível.”
Ao longo da entrevista, o parlamentar também comentou o diálogo que manteve com o Ministério da Justiça sobre o tema e criticou a forma como o governo Lula tratou a questão da segurança pública. Segundo ele, o Executivo “tentou copiar o tema, mas sem coragem de levar adiante as medidas necessárias”.
O deputado diz apoiar a PEC da Segurança Pública, de autoria do governo, mas ressalta que ela “trata apenas de gestão e integração”, enquanto seu projeto tem “caráter repressivo e protetivo”.
“O texto do governo fala de estrutura e gestão, e é importante. Mas o que eu proponho é uma lei que dê poder real de ação à Polícia Federal e enquadre o crime como ele é: terrorismo.”
Especialistas contestam
Apesar da defesa de Forte, o projeto enfrenta críticas de constitucionalistas e diplomatas, que consideram o texto vago e potencialmente perigoso. A ampliação do conceito de terrorismo, segundo eles, pode ter efeitos jurídicos e diplomáticos indesejados, vinculando o país automaticamente a tratados internacionais de contraterrorismo e afetando a autonomia do Brasil em decisões de segurança interna.
Juristas também alertam que o projeto não deixa claro o que diferencia facções e milícias de outros grupos criminosos, o que pode levar à aplicação arbitrária da lei. “Ao chamar de terrorista o que já é criminoso, o Estado cria um precedente perigoso para restringir liberdades”, disse um professor de direito penal ouvido pela reportagem.
Forte rebate essas críticas e diz que seu projeto é “uma resposta à omissão do Estado”.
O texto ainda não tem relator definido, mas deve passar pelas comissões de Segurança Pública e Constituição e Justiça antes de chegar ao plenário. No governo, auxiliares do ministro Ricardo Lewandowski classificam o projeto como “mais político do que técnico” e avaliam que ele sobrepõe leis já existentes.
Entre a defesa de um Estado mais forte e o risco de ampliação do poder repressivo, o projeto de Danilo Forte se tornou símbolo de uma disputa maior, entre o combate legítimo ao crime e os limites democráticos de uma legislação que pode mudar o conceito de terrorismo no Brasil.