Por André Fernandes*
O dia 28 de outubro de 2025 entra para a história como um dos mais tristes do nosso país. Uma data marcada pelo sangue de 128 mortos, até agora, enquanto escrevo este texto, numa operação policial desastrosa, planejada e executada pelo governo do estado do Rio de Janeiro, que escancara o que há de mais cruel na velha política: o uso da morte como instrumento eleitoral.
Enquanto o povo chora seus mortos, o governador comemora. Em suas próprias palavras, chamou o massacre de “a maior operação que já tivemos”. Mas, ao contrário do que ele festeja, o Brasil chora pela maior matança de nossa história, e o mundo inteiro observa, através da imprensa e das redes sociais, essa atrocidade nunca antes vista.
Essa é a política da morte, resquício de uma ideologia que ajudou a eleger um presidente condenado por atentar contra a democracia, e que agora se repete nas ações do atual governo estadual. Uma lógica perversa que tenta transformar segurança pública em palanque e sangue em propaganda.
O que vimos ontem foi uma guerra unilateral, em que o Estado invade territórios pobres com carros de combate e fuzis, mas não chega com mais escolas, cultura ou oportunidades. Entrar nas favelas apenas com a força policial, sem o social, é mais do que enxugar gelo, é um estupro do Estado, porque ele entra com a violência, mas não entra com o que a favela mais precisa: dignidade, educação, saúde e oportunidades de verdade.
O Rio de Janeiro amanheceu hoje tomado pelo medo. O dia seguinte à chacina é de luto, revolta e incerteza. As ruas paradas, o comércio fechado, o silêncio pesado nas periferias. A cidade inteira refém de uma política fracassada que insiste em tratar pobreza como caso de polícia.
E o contraste é gritante: dias atrás, a Polícia Federal, sob o comando do governo federal, realizou uma operação exemplar na Faria Lima, em São Paulo, sem um disparo, sem mortes, com inteligência e estratégia. É esse tipo de ação que o país espera: uma polícia investigativa, técnica, que combate o crime sem massacrar inocentes.
O governo federal tem mostrado que é possível enfrentar o crime com inteligência, sem transformar o povo em alvo. Já o governo do estado do Rio escolheu o caminho oposto: o da barbárie, da força bruta e da morte.
Nos 25 anos da Agência de Notícias das Favelas, nunca tínhamos visto tamanha atrocidade. Uma chacina dessa magnitude é um golpe direto contra os direitos humanos, contra a democracia e contra a vida.
O que aconteceu no dia de ontem precisa ser investigado com toda a força da lei. O Ministério Público precisa agir, a Justiça precisa responsabilizar, e o Estado precisa responder. Porque nenhuma democracia pode se sustentar sobre o corpo de seus próprios cidadãos.
A favela quer paz. Quer justiça. Quer viver.
E viver não é privilégio, é um direito.
*Fundador da Agência de Notícias das Favelas e do jornal A Voz da Favela.