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Apesar de avanços na participação feminina nas empresas, a igualdade salarial segue distante da realidade brasileira. De acordo com o 4º Relatório de Transparência Salarial e Critérios Remuneratórios do MTE (Ministério do Trabalho e Emprego), divulgado antecipadamente em reportagem da Folha de S.Paulo, as mulheres recebem, em média, 21,2% menos que os homens nas 54 mil empresas com cem ou mais funcionários.
A remuneração média feminina é de R$ 3.908,76, enquanto a dos homens chega a R$ 4.958,43. A desigualdade é ainda mais profunda quando se considera cor e raça: mulheres negras ganham 53,3% menos que homens brancos, com média de R$ 2.986,50 frente a R$ 6.391,94.
O levantamento analisou 19,4 milhões de vínculos trabalhistas, sendo 41,1% de mulheres e 58,9% de homens, com base na Rais (Relação Anual de Informações Sociais), referentes ao período do 2º semestre de 2024 ao 1º semestre de 2025.
Entre 2023 e 2025, o número de empresas analisadas cresceu de 50,6 mil para 54,1 mil, acompanhando a recuperação econômica. O total de mulheres contratadas aumentou 11%, alcançando 8 milhões de vínculos.
O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, e a ministra das Mulheres, Márcia Lopes, apresentarão nesta segunda-feira (3) os dados do do relatório. A divulgação integra as ações previstas na Lei de Igualdade Salarial, que busca promover transparência e equidade nas relações de trabalho.
Igualdade salarial: diferença estagnada
Mesmo com o aumento na presença feminina, a distância salarial pouco mudou: mantém-se em torno de 20% desde que o relatório começou a ser divulgado, há dois anos.
“O avanço ainda é tímido”, disse à Folha Paula Montagner, subsecretária de Estatísticas e Estudos do Trabalho do MTE. Segundo ela, o relatório tem caráter diagnóstico. “Ele mostra que há algo a ser corrigido dentro da empresa”, explicou. Quando há diferença de remuneração entre homens e mulheres em cargos equivalentes, as companhias precisam justificar os motivos.
Os principais fatores apontados pelas empresas para as disparidades são tempo de experiência (78,7%), metas de produção (64,9%) e planos de cargos e salários (56,4%).
A ministra das Mulheres, Márcia Lopes, considera a situação “inaceitável”, especialmente no caso das mulheres negras. “Nosso compromisso é intensificar medidas que resolvam essas distorções”, afirmou ao jornal. Entre as ações defendidas estão licença-paternidade ampliada, auxílio-creche e redistribuição do trabalho doméstico.
Avanços pontuais e desafios regionais
O relatório mostra um aumento de 21,1% no número de empresas com ao menos 10% de mulheres negras em seus quadros, que passaram de 29 mil para 35 mil desde 2023. Também subiu em 6,4% o número de companhias com diferença salarial de até 5% entre homens e mulheres.
A remuneração das mulheres teve leve alta em diversas ocupações: serviços administrativos (+1,5%), atividades operacionais (+2,1%), dirigentes e gerentes (+2,7%) e trabalhadoras com nível superior (+3,5%).
Os estados com maior desigualdade salarial são Paraná (28,5%), Rio de Janeiro (28,5%), Santa Catarina (27,9%), Mato Grosso (27,9%) e Espírito Santo (26,9%). Já as menores diferenças aparecem no Piauí (7,2%), Amapá (8,9%), Acre (9,1%), Ceará (9,9%), Pernambuco (10,4%) e Distrito Federal (9,3%).
Paula Montagner acredita que o tema pode ganhar fôlego com a análise, pelo STF (Supremo Tribunal Federal), das ações sobre a constitucionalidade da divulgação dos relatórios de transparência salarial. “Se o STF validar a publicação, os avanços podem ser mais rápidos”, afirmou.
Transparência e políticas de equidade
Sancionada em julho de 2023, a Lei da Igualdade Salarial obriga empresas com cem ou mais funcionários a divulgar relatórios semestrais sobre remuneração e a adotar medidas de promoção da equidade de gênero. Entre as iniciativas previstas estão licença parental estendida, flexibilidade de jornada — já presente em 44% das empresas — e auxílio-creche, oferecido por 21,9% delas.
No Brasil, a igualdade salarial é um direito previsto na CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) desde 1943, mas que, mais de 80 anos depois, ainda enfrenta barreiras estruturais e culturais.
O relatório do MTE reforça que a transparência é um passo necessário, mas insuficiente, para corrigir uma desigualdade que persiste no tempo e na sociedade.