Casa EconomiaBolsonaro reconhece conspiração golpista em recurso ao STF, mas alega ter ‘desistido’

Bolsonaro reconhece conspiração golpista em recurso ao STF, mas alega ter ‘desistido’

por Amanda Prado
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Por Cleber Lourenço

Apresentados na noite desta segunda-feira (27), os embargos de declaração protocolados pela defesa de Jair Bolsonaro no Supremo Tribunal Federal (STF) trazem novamente o argumento de que o ex-presidente teria “desistido” de executar um plano golpista que, segundo o próprio texto, estaria em andamento no fim de seu governo.

A mesma tese já havia sido usada pelos advogados durante as sustentações orais no julgamento da Ação Penal 2668, e agora é retomada em caráter formal, como tentativa de reverter a condenação imposta pelo Supremo.

O documento, com mais de 70 páginas e endereçado ao ministro Alexandre de Moraes, relator do caso, tenta afastar a responsabilidade de Bolsonaro pelos crimes de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. Em um dos trechos, os advogados afirmam:

“Admitida, ainda que de forma equivocada, a existência de início de execução, a conduta do Embargante se enquadraria na hipótese de desistência voluntária.” (p. 44)

A formulação, cuidadosamente redigida, tem peso político e jurídico: ao sustentar que houve um “início de execução”, ainda que em tese, a defesa admite a existência de um plano articulado. A tese tenta enquadrar Bolsonaro como alguém que teria recuado antes de consumar o crime, pedindo que seja aplicado o artigo 15 do Código Penal, que prevê a exclusão de pena em casos de desistência voluntária.

“Após as reuniões mencionadas na denúncia, o então Presidente da República não apenas se absteve de praticar qualquer ato formal, como também adotou postura pública de desestímulo e recuo, encerrando, por iniciativa própria, o suposto percurso executivo.” (p. 45)

Na sequência, o recurso cita o voto divergente do ministro Luiz Fux, que teria reconhecido a plausibilidade da tese ao afirmar que, “caso houvesse início de execução, o Embargante deliberadamente interrompeu o curso dos fatos, caracterizando a desistência voluntária” (p. 47).

Juristas ouvidos pela reportagem ressaltam que a tese de desistência voluntária só é aplicável quando há indícios de que o crime já estava em andamento e o autor decide, por vontade própria, interromper a execução. Nesse sentido, ao insistir nessa linha argumentativa, a defesa reconhece o contexto fático de uma conspiração golpista, ainda que tente negar a intenção de levá-la adiante.

Bolsonaro e os atos golpistas

Bolsonaro, porém, segue tentando se distanciar dos atos de 8 de janeiro e das articulações dentro do governo para contestar o resultado das eleições de 2022. O recurso afirma que ele “jamais deflagrou qualquer medida de exceção” e que teria “desautorizado manifestações impulsivas de seus apoiadores”.

Ainda assim, o reconhecimento de um “percurso executivo” e de um “recuo voluntário” torna-se um marco político: é a primeira vez que sua defesa reconhece, mesmo que de forma indireta, a existência de uma conspiração em curso.

Os embargos têm pouco potencial de alterar o resultado do julgamento. Mas o texto da defesa, ao mesmo tempo em que tenta atenuar a culpa do ex-presidente, crava na própria narrativa jurídica o reconhecimento de uma conspiração golpista — ainda que, segundo os advogados, ela não tenha passado de intenções não executadas.

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