Por Cleber Lourenço
A proposta de anistia aos envolvidos nos atos de 8 de janeiro está praticamente enterrada no Congresso. O tema, que já inflamou a disputa entre governo e oposição, perdeu apelo político e foi substituído pelas tratativas orçamentárias e pelas movimentações partidárias de olho nas eleições do próximo ano. No plenário, reina o silêncio: ninguém quer assumir o desgaste de uma votação que não rende dividendos eleitorais.
Nos bastidores, membros da articulação política do Palácio do Planalto descrevem um ambiente de desmobilização total. A leitura é de que o Congresso vive uma espécie de impasse confortável, em que nenhum lado quer se mover.
“Ninguém está querendo votar a LDO por agora. Para o governo é ruim, pois antecipa o calendário de emendas e, a cada dia que passa, melhora — isso é o normal — as estimativas de receitas. Então cabe mais coisa para o ano que vem. Para a oposição também não é bom porque, apesar de antecipar o calendário das emendas, acaba sendo uma ‘vitória’ para o governo e reduz uma frente de pressão por mais recursos”, avaliou uma fonte do Planalto.
A líder do PSOL na Câmara, deputada Talíria Petrone, também afirma que a anistia já saiu do horizonte político.
“Olha, não vejo nenhum clima para a anistia avançar. A mobilização nas ruas derrubou, enterrou de vez a PEC da blindagem, garantiu que o imposto de renda fosse aprovado, com isenção para quem ganha até R$ 5 mil, compensando naqueles do andar de cima, os mais ricos do Brasil. Sendo bem franca, o povo brasileiro incidiu fortemente na pauta do Congresso e derrotou a oposição”, avaliou Petrone.
O deputado Mário Heringer (PDT-MG) tem avaliação semelhante e vai além ao destacar a condução do presidente da Câmara, Hugo Motta.
“O espaço para votação da anistia está cada dia mais distante e a discussão já se exauriu, se encerrou por si própria. Uma turma não quer, dentre eles eu, e outra turma quer, ampla ou restrita — impossível. Esse impasse gera um desconforto que tem que acabar e acabou”, disse Heringer.
“Eu acho que o presidente Hugo Motta tomou a decisão de não mais discutir esse assunto, uma vez que não leva a nenhuma vantagem para o Brasil”, completou.
Heringer elogiou a condução de Hugo Motta à frente da Câmara em meio ao clima político tenso. Vários deputados compartilham essa avaliação, considerando que a decisão de não pautar a anistia foi estratégica. O consenso é que o tema não traria ganhos políticos e apenas reacenderia a polarização, justamente quando a Câmara busca recuperar estabilidade interna.
Orçamento de 2026
Enquanto isso, governo e Centrão se voltam integralmente para a LDO e a disputa por espaço no orçamento de 2026. O cálculo político é simples: quanto mais o tempo passa, melhores as estimativas de receita e maior a margem para acomodar aliados com novas emendas e verbas.
Ainda assim, a oposição promete um último gesto na reunião de líderes marcada para quinta-feira (24), quando será definida a pauta da próxima semana. Deputados contrários à anistia tentarão recolocar o tema em discussão, mas a avaliação predominante é que a tentativa será apenas protocolar.
No Planalto, a leitura é pragmática: a anistia já foi abandonada, e dificilmente voltará à mesa antes da definição do orçamento e das alianças políticas. Até lá, o tema segue soterrado sob o peso das emendas e das ambições eleitorais.