Casa EconomiaFMI vê Banco Central como o ‘mais duro’ do mundo; Haddad concorda

FMI vê Banco Central como o ‘mais duro’ do mundo; Haddad concorda

por Adriana Cardoso
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Durante os encontros anuais do FMI (Fundo Monetário Internacional) e do Banco Mundial, realizados na última semana em Washington, o Banco Central do Brasil foi amplamente reconhecido como a autoridade monetária mais conservadora (hawkish) entre as principais economias globais. Isso porque, na contramão dos bancos centrais do mundo, o BC brasileiro mantém a taxa básica de juros, a Selic, entre as mais altas (15% ao ano), mesmo com uma inflação em baixa.

Embora não seja um comportamento recente, a insistência da instituição em manter a Selic em 15% — mesmo com sinais de desaceleração econômica e projeções de inflação mais baixas — reforçou essa imagem.

Segundo fontes que participaram dos encontros, incluindo representantes de grandes bancos e fundos globais, o BC brasileiro apresentou um discurso claro: os juros continuarão altos por um período prolongado.

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou, segundo a coluna de Miriam Leitão, que a atual taxa de juros no Brasil está mais alta do que o necessário diante das condições econômicas atuais. Ele ainda destacou que, se integrasse a diretoria do Banco Central, defenderia uma política monetária mais branda.

“No Banco Central existem nove diretores que decidem isso. Todo o resto é cidadão. Não importa se é ministro da Fazenda, jornalista, tanto faz. E hoje todo mundo tem opinião, mas são nove pessoas que decidem. Se eu estivesse lá no Banco Central, eu teria essa opinião: a de que a taxa de juros está restritiva demais para as condições atuais, de trajetória de preços, de desaceleração dos alimentos, uma série de coisas. Tem economista que tem outra visão, e ninguém sai xingando um economista porque ele acha que tem que subir juros. Cada um tem o direito à sua opinião. E é essa a minha”, afirmou o ministro.

O ministro ressaltou que a inflação vem mostrando comportamento mais favorável, com projeções do mercado indicando taxas abaixo de 4% em 2027. Para ele, o cenário atual demonstra espaço para ajustes graduais nos juros, sem comprometer o controle de preços.

Haddad também mencionou que concorda com a avaliação do Fundo Monetário Internacional (FMI), segundo a qual o Banco Central do Brasil é um dos mais “hawkish” do mundo, ou seja, adota postura mais rígida e conservadora na política monetária.

Relatório do Banco Central mostra mercado revisando apostas

As falas dos diretores Nilton David e Paulo Picchetti, membros do Copom (Comitê de Política Monetária), durante os encontros, indicaram uma forte alinhamento interno em favor da manutenção da Selic alta dentro do Banco Central.

Essa sinalização fez o mercado postergar as expectativas de início do ciclo de cortes. Se antes se especulava uma redução já em dezembro de 2025 ou janeiro de 2026, agora analistas projeta, conforme o Boletim Focus divulgado na segunda-feira (20), que o afrouxamento monetário só deve começar entre abril e junho de 2026.

Os derivativos de juros reforçam essa leitura: segundo a precificação mais recente, há 85% de chance de a Selic permanecer em 15% até dezembro, e 58% de probabilidade de que essa taxa continue em vigor até janeiro.

Foco total: inflação próxima de 3%

O presidente do Banco Central, Gabriel Galípolo, já deixou claro por diversas vezes que o foco do Banco Central é atingir o centro da meta de inflação definida pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), do qual fazem parte os ministérios da Fazenda e do Planejamento, e o BC, em 3% e não o teto de 4,5%. A ideia é persegui-la mesmo que isso signifique manter os juros em patamar elevado por mais tempo.

Embora criticado por parte dos empresários, do setor produtivo e dentro do próprio governo, como já disse o ministro Fernando Haddad (Fazenda) em entrevista ao ICL Notícias 1ª edição, o posicionamento conservador vem sendo bem visto por investidores estrangeiros, que observam o real valorizado, os prêmios de risco controlados e o IPCA (inflação oficial) em queda como sinais de estabilidade — algo escasso em muitas economias emergentes.

Gasolina mais barata pode antecipar alívio inflacionário

Um fator que pode mudar esse cenário — ou ao menos pressionar o BC por uma postura mais flexível — é a recente decisão da Petrobras de reduzir o preço da gasolina. O anúncio pode acelerar a queda da inflação e antecipar o retorno da taxa aos limites da meta estabelecida pelo CMN ainda este ano.

De acordo com o Banco Central, em carta publicada em junho de 2025, a expectativa era de que o IPCA retornasse à faixa de tolerância apenas no final do primeiro trimestre de 2026. Caso a meta fosse estourada até lá, seria necessária a publicação de nova carta explicativa à sociedade.

Mas o corte no preço do combustível, segundo projeções de analistas, pode retirar 0,1 ponto percentual do IPCA acumulado de 2025, o que ajuda a reduzir as expectativas de inflação.

Projeções em queda e cenário mais benigno

O Boletim Focus divulgado na segunda-feira mostra a mediana das projeções de inflação para 2025 em 4,70%, levemente abaixo dos 4,72% da semana anterior. A tendência é de novas revisões para baixo nos próximos dias, à medida que o impacto da gasolina mais barata for incorporado aos modelos.

Se essas previsões se confirmarem, o IPCA de 2025 pode ser o mais baixo desde 2019, quando a inflação fechou o ano em 4,31%. Em abril deste ano, o mesmo indicador era projetado em 5,7% — uma diferença de mais de 1 ponto percentual em poucos meses.

Esse movimento de desinflação é atribuído a uma combinação de fatores:

  • Valorização do real
  • Surpresas positivas na inflação corrente
  • Postura conservadora do Banco Central
  • Arrefecimento da atividade econômica

Conservadorismo com custo

Embora a política monetária do BC tenha ancorado expectativas e ajudado a estabilizar o câmbio, há um custo: o crescimento da economia tem mostrado sinais de desaceleração. A combinação de crédito caro, consumo em queda e investimentos travados começa a afetar as projeções do PIB para 2026.

Setores da indústria e do varejo têm cobrado um sinal mais claro de flexibilização da política monetária. Para parte do mercado, essa atitude busca evitar reversões abruptas nas expectativas e garantir que a inflação seja controlada de forma estrutural, e não apenas conjuntural.

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