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Um passo na direção certa

por Jose Socrates
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Comecemos pela justiça de reconhecer que a libertação dos reféns e o cessar-fogo em Gaza são um sucesso político. Trump fez deste acontecimento um grande espetáculo, mas, reconheçamos, desta vez fez alguma coisa pela paz no mundo. Estamos longe de um acordo de paz, é certo, mas tudo o que foi feito é um passo na direção certa: o acordo parou a matança e devolveu os reféns às suas famílias.

Os problemas do acordo são dois – nenhuma garantia de autodeterminação do povo palestiniano, por um lado; nenhuma garantia de um estado palestiniano, por outro. Podemos concordar que essa discussão virá a seguir, que o processo político é muito delicado e que exige a paciência dos pequenos passos como método político. Mas devemos também concordar que o direito do povo palestiniano a decidir o seu futuro é um ponto básico de qualquer plano de paz justo e que o protetorado político que se prepara em Gaza e na Cisjordânia não é uma solução politicamente aceitável – ela parece, isso sim, um regresso aos tempos coloniais.

Dir-me-ão que esta solução política tem o peso de Donald Trump por detrás – e que essa é a força real deste acordo. Certo. Pela minha parte digo até mais: se Trump quer fazer desta negociação a sua maior realização no campo da política externa americana, então esse esforço deve ser celebrado. Afinal, desde que os Estados Unidos se consagraram como superpotência global, poucos presidentes se distinguiram apostando tudo na paz. Se for esse o plano, ele só pode ser bem-vindo.

Todavia, agora que os reféns foram libertados, vão começar as dificuldades. Quem vai gerir Gaza? Quem vai gerir a Cisjordânia? E talvez mais importante – quando é que se vai dar voz aos palestinos para escolherem os seus representantes e decidirem o seu futuro? Estas perguntas são incómodas, mas vão começar a ser feitas, agora que os reféns foram libertados e as armas se calaram.

Devo dizer que a minha expetativa não é grande. Primeiro, porque a solução dos dois Estados não é apoiada por Israel e sem ela não estou a ver caminho de paz possível.

E, por favor, paremos com as fantasias reconfortantes, a solução dos dois Estados é uma solução recusada pelos israelitas, não apenas por Netanyahu. A limpeza étnica como solução militar sempre teve apoio do povo israelita – nunca se tratou de derrotar o Hamas, mas de aniquilar a população que apoia o Hamas. A política de mortandade em Gaza foi apoiada pela maioria dos israelitas sem nenhum problema de consciência, o que pode ser provado com o resultado de uma pesquisa sobre se há ou não há inocentes em Gaza: sessenta e dois por cento dos israelitas disseram que não, que não há inocentes em Gaza. É horrível, bem sei, mas é a verdade: a matança em Gaza sempre foi uma política nacional, nunca foi uma política de Netanyahu.

No final das contas, o sucesso deste acordo está entregue ao poder dos Estados Unidos e à determinação de Trump em deixar um legado de paz. A pergunta desloca-se, então, para o interior da vida política da América: quem manda mais na política externa do médio oriente – o lobby judaico ou os reais interesses americanos na região?  A resposta a esta pergunta decidirá o futuro deste acordo.

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